A CAPA IMPLACÁVEL DA NEBLINA

In ABCD, Artigo On

Guttemberg Guarabyra

A poeira do tempo encobriu os anos, mas não turvou a vida.

Não era pelos olhos verdes.

Era pela voz que, independente das palavras, dizia um amor que me apaixonava.

Mas não era pelos olhos verdes.

E sim pelos passos rodopiantes para descrever um caso, cabelos soltos ajudando a cenografar o conto, a risada a sublinhar a cena feito trilha de cinema.

Pelos olhos verdes, não era.

Era pelo magnetismo. Um imã. Aquela pele puxava minha alma em direção à dela, e não aos olhos verdes.

Que não tinham esse poder de atração, apesar do brilho.

Quem sabe o escracho livre num mundo em que imperava o bem comportar-se.

Quem sabe a felicidade de vê-la despontar no longe da rua, e saber que a prosa jamais marcada chegaria novamente na hora nunca aprazada e sempre certa.

E claro que não era pelos olhos verdes. Caso contrário, sem poder divisá-los, não sentiria tal alvoroço no espírito causado por quem ainda vinha tão longe.

Talvez fossem os segredos. Jamais contava-lhe sobre meu amor. Jamais me contou sobre o que sentia.

E assim jamais fomos o que tinha nem o que não tinha que ser.

A poeira do tempo encobriu os anos, mas não turvou a vida.

Sob a capa implacável da neblina não posso mais ver a cena da prosa, os passos largos, a pele ardente, nem ouvir a risada, trilha de cinema, nem sentir a força do imã, nem rever os cabelos esvoaçando o conto, nem desouvir as palavras que não tinham voz, dessaber de segredos, nem admirar o escracho bailado driblando a disciplina careta, nem o vulto adentrando a rua, fazendo o coração pulsar a alma.

A capa implacável da neblina só me permite ver, ainda, quem diria, aqueles olhos verdes.

Música do dia

Aqueles olhos verdes (Aquellos ojos verdes)

  • Guttemberg Nery Guarabyra Filho, ou Guttemberg Guarabyra, ou apenas Guarabyra, nascido em Barra, Vale do São Franscico, Interior da Bahia, cronista de ABCD REAL, músico, compositor, escritor e poeta brasileiro. Entre seus maiores sucessos como compositor estão as canções “Mestre Jonas” e “Outra vez na estrada” (ambas em parceria com Luiz Carlos Sá e Zé Rodrix), “Casaco Marrom” (com Renato Correa e Danilo Caymmi), “Sobradinho” (com Luiz Carlos Sá) , “Espanhola” (com Flávio Venturini), Dona e muito mais. Escreveu O Outro Lado do Mundo e Teatro dos Esquecidos, além de inúmeras crônicas.

 

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