País precisa agir rapidamente para conter, em primeiro lugar, o surto de importações, sob risco de perder fábricas e empregos
Joaquim Alessi
Dados do Relatório de Acompanhamento Conjuntural relativos ao 1º semestre de 2024 revelam, acima de tudo, que a produção de químicos de uso industrial caiu 1,14%.
Já o volume de exportações recuou expressivos 27,5%, em relação ao esmo período de 2023.
Isso demonstra, por exemplo, que além de encontrar dificuldades para competir no mercado local, a indústria química brasileira está com fortes problemas de competição no mercado externo.
Os demais indicadores de volume apresentaram, em suma, crescimento no acumulado entre janeiro e junho deste ano.
As vendas internas subiram 4,39% e consumo aparente (CAN) cresceu 0,4%.
Mas, isso não traduz fielmente o cenário crítico pelo qual o setor vem passando, visto que as importações continuam crescendo paulatinamente.
Neste mesmo período, elas apresentaram, por exemplo, alta de 4,5%, alcançando expressivos 45% da demanda local.
Consequentemente, o nível de utilização da capacidade instalada ficou, portanto, em 63% nos primeiros seis meses deste ano.
Ou seja, três pontos porcentuais abaixo do registrado na média de igual período de 2023.
Destaque para o grupo intermediários para fertilizantes.
Esse recuou de 67% o uso da capacidade instalada entre janeiro e junho do ano passado para apenas 58% nos seis primeiros meses de 2024.
Sobretudo pela hibernação das plantas de intermediários para fertilizantes do grupo Unigel.
Grupos mais afetados pelas importações
No acumulado do 1º semestre de 2024, em relação ao mesmo período de 2023, o volume importado da amostra de produtos do RAC, excluindo os intermediários para fertilizantes, cresceu 21%, com recuo de preços dessa amostra da ordem de 9%.
As maiores altas de importações ocorreram nos grupos de resinas termoplásticas (+48,2% volume e -8,6% preço).
Depois, em intermediários para resinas termofixas (+42,4% volume e -16% preço) e solventes industriais (+39,9% volume e -6,9% preço).
Finalmente, em resinas termofixas (+31% volume e -16,1% preço).
Preços
Em termos de preços praticados no mercado doméstico, o IGP Abiquim-Fipe subiu ligeiramente em junho de 2024 (+0,09%).
Isso na comparação com o mês anterior, acumulando alta nominal de 4,94% entre janeiro e junho de 2024.
Em termos “reais”, o IGP Abiquim-Fipe, deflacionado pelo IPA-Indústria de Transformação, acumulou crescimento de 4,8% entre janeiro e junho deste ano.
Em igual período, deflacionando-se o IGP pela variação do Real, em relação ao Dólar, os preços médios registraram queda de 8,6%.
Em relação ao Euro, o recuo foi de 5,7%.
Importante frisar o aumento de preços de matérias-primas e energia, pressionando os custos no mercado local.
Cenário
A indústria química brasileira vem sendo muito impactada pela falta de competitividade de suas principais matérias-primas.
No que se refere ao gás natural, a indústria nacional paga um valor de US$ 12,4/MMBTU.
O mesmo gás é vendido por cerca de US$ 1,5/MMBTU nos EUA, por US$ 8,6/MMBTU na Europa e, na fronteira da Bolívia com o Brasil, por U$ 6,2/MMBTU.
Segundo Fátima Giovanna Coviello Ferreira, diretora de Economia e Estatística da Abiquim, mesmo a maior parte da atual oferta de gás
para o mercado brasileiro sendo produzida em território nacional, infelizmente o consumidor brasileiro acaba, em suma, pagando como se
estivesse importando GNL, hoje o maior custo de gás no mercado internacional.
“Essa situação foi agravada pelo intenso surto de importações de produtos químicos vindos de países asiáticos com competitividade artificialmente sustentada em insumos (gás natural e energia) e matérias-primas russas adquiridos por tais países com preços favorecidos em razão da guerra no leste europeu, deslocando os produtos fabricados no Brasil no próprio mercado interno e nos seus principais parceiros
comerciais. Hoje, a China é o principal destino de exportações de óleo e gás da Rússia”, diz Fátima.
Memorando inédito
Vale destacar que em abril a Abiquim, em parceria inédita e histórica, assinou um Memorando de Entendimento com a Petrobras para avançar na possibilidade de compra de gás no mercado livre e também em buscar alternativas para elevar a oferta de gás natural.
No mês passado, por sua vez, a entidade participou da comitiva brasileira, liderada pelo Ministério de Minas e Energia, em negociação na Bolívia sobre a possibilidade da nova oferta de gás natural do país vizinho e ainda a utilização de gás da Argentina por meio do Gasbol.
No âmbito geral, para contribuir no debate público sobre as melhores práticas de uma política comercial externa equilibrada, o segmento químico propôs ao governo a inserção de 63 produtos químicos na Lista de Elevações Transitórias da Tarifa Externa Comum do Mercosul.
Desequilíbrios
Deve haver, na prática, portanto, uma elevação de impostos de entrada no Brasil para estes itens.
Pelo menos para compensar parcialmente os desequilíbrios de competitividade das matérias-primas na Ásia em relação ao Brasil.
“Este pedido está em análise na Câmara de Comércio Exterior (Camex) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Em recente encontro com o presidente Lula, recebemos com esperança o sinal verde dado ao setor, um respiro no sentido da aprovação da lista”, enfatiza, em resumo, André Passos Cordeiro, presidente-executivo da Abiquim.
Coviello afirma, da mesma forma, que além da urgência na implementação dos pleitos de inclusão de produtos químicos na lista transitória de elevação do imposto de importação, a Associação aguarda a divulgação do Programa Gás para Empregar.
“O País precisa contemplar nesse projeto medidas que destravem investimentos em infraestrutura de escoamento e tratamento de gás, aumentem a oferta de gás para o mercado, mas sobretudo que ajudem a indústria a enfrentar essas diferenças gritantes em relação aos comparativos internacionais de preços de gás”, afirma, em conclusão.