Pandemia impulsionou diálogo e negociações entre as partes
Desde que entrou em vigor – há quase quatro anos –, a reforma trabalhista de 2017 (Lei nº 13.467/17) divide opiniões quanto à alteração que promoveu nas relações coletivas de trabalho e a seus esforços para modernizar as regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Agora, em meio ao contexto desafiador da pandemia, a reforma está novamente em pauta à medida que os acordos coletivos que vêm sendo celebrados pelos sindicatos – estes enfraquecidos – vêm alcançando nova força: em diversas situações, a legislação tem determinado que “o acordado está acima do legislado”, ainda que dentro dos parâmetros estabelecidos pela CLT.
“A reforma ampliou as possibilidades de negociação e validou o ajuste de vontade das partes da relação de trabalho: as condições que foram objeto de negociação firmada em acordo coletivo passaram a ter maior validade, muitas vezes prevalecendo sobre a convenção coletiva ou a lei”, explica a advogada e especialista em Direito do Trabalho, Karolen Gualda.
A flexibilização é polêmica, mas, com ela, “o Brasil fica alinhado aos países que buscam a liberdade sindical – que alia a intervenção do Estado para a imposição dos direitos básicos do trabalhador de um lado e, de outro, viabiliza a autorregulação das condições de trabalho por meio dos entes coletivos”, observa o também advogado especialista em Direito do Trabalho e Juiz, Otavio Calvet. Para ele, “a maior flexibilidade é um instrumento para conquistas dos trabalhadores, mas, para a equação ser perfeita, há de se ter um movimento sindical forte e bem estruturado – o que, no momento, infelizmente, parece não ser a regra, principalmente após o fim da contribuição sindical compulsória”. Ainda assim, ele crê que tudo isso fortalece o sindicalismo brasileiro, “que agora precisa suportar a responsabilidade por criar acordos a partir do desejo da coletividade, expressa em assembleia e concretizada em negociação”.
A advogada Karolen Gualda concorda: “Os sindicatos sérios, realmente empenhados em defender sua categoria, ainda exercem grande poder nas negociações e conseguem garantir a manutenção dos direitos e a ampliação dos benefícios ofertados aos trabalhadores”. E completa: “Nesse momento de pandemia foi possível observar uma grande atuação dos sindicatos na negociação de inúmeros acordos onde regras trabalhistas foram flexibilizadas. O intuito, claro, era garantir-se a manutenção das vagas de emprego, e com isso, jornadas de trabalho foram flexibilizadas, verbas rescisórias puderam ser parceladas, o trabalho híbrido foi implementado, enfim, diversos temas foram levados ao debate para que, ao fim, pudessem ser implementados. Não obstante, é oportuno lembrar que a Justiça do Trabalho sempre poderá analisar o caso concreto caso alguma dessas regras flexibilizadas seja questionada judicialmente.”
De acordo com ambos os especialistas, os novos acordos coletivos comprovam a modernização promovida pela reforma trabalhista. “Apesar das críticas pertinentes que recebeu, ela foi um avanço para a legislação trabalhista: era preciso se adaptar às novas realidades, aos novos formatos de relação de trabalho e aos novos trabalhadores”, diz Karolen Gualda.
Para Otavio Calvet, os acordos coletivos hoje em negociação refletem que, muitas vezes, a vontade da categoria é diferente da regulação criada pelo legislador. “O caminho do futuro é uma legislação mais leve, flexível e responsável, que possa alcançar a maior parte da população ativa e que esteja alinhada a uma nova ideia de Direito e Processo do Trabalho, onde cada ator social deve suportar as responsabilidades de suas escolhas”, conclui o especialista.
Fontes:
Otávio Calvet, advogado e especialista em Direito e Processo do Trabalho; Juiz do Trabalho no TRT/RJ; Mestre e Doutor em Direito do Trabalho pela PUC de São Paulo; Mestre em Direito Social pela Universidad Castilla La Mancha – Espanha. Professor convidado de pós-graduação: ATAME, IEPREV, IMADEC, Faculdade Baiana de Direito, IBMEC, FDV, CERS. Coordenador Pedagógico da Pós-Graduação online da Faculdade ATAME. Coordenador Pedagógico e Professor do Atameplay. Membro honorário do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB).
Karolen Gualda, advogada especializada em Direito do Trabalho na Natal & Manssur Advogados, com experiência em contencioso trabalhista. Formada pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) e pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade de São José do Rio Preto (UNIRP).