Ex-aluna da USP, em São Carlos, a matemática Jaqueline Godoy Mesquita é a terceira mulher a ocupar presidência da instituição
Ela é mulher, jovem e nasceu na Região Norte do Brasil. A soma dessas três características tornaram histórica a cerimônia em que a cientista Jaqueline Godoy Mesquita assumiu a liderança da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM). “Você não se imagina em um lugar em que não vê pessoas iguais a você, que não possui representatividade”, disse ao iniciar o discurso de posse , na tarde desta quarta-feira, 26 de julho, durante o 34º Colóquio Brasileiro de Matemática, realizado no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), no Rio de Janeiro.
“Quando eu entendi o que era a SBM, minhas únicas referências de presidentes da sociedade eram homens. Demorei muito para saber que existiram outras mulheres a ocuparem este cargo, e que essas poucas mulheres marcaram a história da matemática brasileira”, revelou Jaqueline. Para ela, é simplesmente inaceitável pensar que, nos 54 anos de existência da SBM, apenas outras duas mulheres foram presidentas da instituição: Keti Tenenblat (de 1989 a 1991) e Suely Druck (de 2001 a 2003 e de 2003 a 2005).
Tão inaceitável quanto isso, destacou Jaqueline, é o fato de nunca, na história da SBM, ter existido um único presidente nascido na Região Norte do Brasil: “Eu nasci no extremo norte do país, na cidade de Boa Vista, Roraima. Sou macuxi com muito orgulho, e estou aqui hoje representando também todos os matemáticos e matemáticas da Região Norte, mostrando que aqui também é o nosso lugar, que podemos sim alcançar a presidência da SBM.”
É preciso adicionar mais um aspecto inédito na história: com 37 anos, Jaqueline é a presidente mais jovem da SBM. “Espero que ter uma jovem na presidência da SBM sirva de reflexão sobre a importância de dar espaço aos jovens do país em cargos como estes,
pois isso abre espaço para que se construam futuras jovens lideranças, que tragam outras visões e perspectivas de mundo”, adicionou a pesquisadora.
Ao colocar em evidência todas as características que tornaram singular sua posse na liderança de uma das instituições acadêmicas mais relevantes do país, o discurso de Jaqueline consegue dar voz à diversidade da matemática brasileira, por tanto tempo escondida: “Hoje, não ocupo este cargo sozinha, mas com todos que formam a minha identidade, como mulher, jovem e nortista deste Brasil”.
Excelência reconhecida
Professora do Departamento de Matemática da Universidade de Brasília (UNB), Jaqueline concluiu o Bacharelado e a Licenciatura em Matemática na mesma instituição em 2006. No ano seguinte, ingressou no mestrado no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, onde também concluiu o doutorado e um de seus pós-doutorados.
Nesse mesmo mês em que tomou posse como presidenta da SBM, a matemática voltou ao ICMC para participar de um concurso, no qual conquistou o título de livre-docente, o mais alto grau de titulação a que um acadêmico pode chegar. Foi também em julho de 2023 que a pesquisadora recebeu uma mensagem especial da Embaixada da Itália no Brasil, comunicando que Jaqueline será agraciada com a Condecoração de Cavaleira da Ordem da Estrela da Itália em cerimônia que ocorrerá dia 4 de setembro.
As conquistas de Jaqueline não param por aí. Em 6 de março deste ano, ela foi a única pesquisadora da América do Sul, Central e do Caribe a conquistar o Science, She says! Award, um reconhecimento oferecido pelo Ministério das Relações Exteriores e Cooperação Internacional da Itália (MAECI) a jovens cientistas estrangeiras de destaque. Já em 10 de outubro de 2019, ela subiu ao palco da Casa Firjan, espaço pertencente à Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), para receber o prêmio Para Mulheres na Ciência na categoria “matemática”. Oferecida pela L’Oréal em parceria com a Unesco Brasil e a Academia Brasileira de Ciências (ABC), a premiação se tornou um importante marco na carreira da jovem, que na época tinha apenas 33 anos.
“Ser mulher na área de matemática não é uma tarefa fácil”, reconheceu Jaqueline ao assumir a liderança da SBM. “Mas ver outras mulheres seguindo adiante e conseguindo
enfrentar os desafios nos dá força e coragem para ir em frente. E, no dia de hoje, eu quero ser essa força e combustível para todas as mulheres deste país que, em algum momento, pensaram em desistir dos seus objetivos, quero dizer a todas elas que não desistam, que precisamos de vocês aqui, precisamos de mais mulheres aqui. Ainda temos muito para lutar, para ocupar, e precisamos ser protagonistas nesta história”.
Com certeza, Jaqueline está ajudando a adicionar os nomes de muitas mulheres à história da matemática brasileira, tornando-se um exemplo e uma inspiração para as jovens que sonham se tornar cientistas. “Farei o meu melhor para atender às expectativas e permitir que a matemática brasileira reflita toda a diversidade deste país, se tornando uma potência ainda maior, tanto em nível básico quanto avançado, tanto nacional quanto internacionalmente”, finalizou Jaqueline.
