Boni e os ótimos tempos, nos bons e maus momentos

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  • Guttemberg Guarabyra

Só não contava que Boni estaria presente ao ensaio do número, achou que a plateia não reagiria bem, que o som de apenas uma flauta e um piano não tinha força suficiente para prender a atenção da multidão.

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Bad times, good times.

Há momentos bons e ruins.

Quando exercia a direção musical do Festival Internacional da Canção, na Globo, tive alguns perrengues com Boni. Coisas normais, de trabalho. Apenas uma das discussões descambou para ofensas pessoais.

Aconteceu quando Paul Horn, um dos maiores nomes do clarinete e da flauta, convidado do Festival, foi impedido por Boni de se apresentar no festival ao lado de Luiz Eça, que chegou a ser considerado o mais completo pianista de nossa música popular.

A missão de se apresentarem, apenas os dois, para o público no Maracanãzinho sempre repleto do Festival Internacional, que naquele tempo permitia a entrada de 30 mil espectadores, não era mesmo fácil.

Mas resolvi experimentar.

Só não contava que Boni estaria presente ao ensaio do número, achou que a plateia não reagiria bem, que o som de apenas uma flauta e um piano não tinha força suficiente para prender a atenção da multidão, e, sem me consultar, suspendeu o ensaio e, consequentemente, a apresentação.

Luís Eça encontrou um telefone público no interior do estádio (a telefonia celular só chegaria dezenas de anos mais tarde) e ligou-me revoltado.

Na sequência, me comuniquei com Boni, não lembro se através de linha especial, já que na época dos ensaios estabelecíamos um sistema particular de comunicação interna entre a sede do Festival, a direção da TV Globo e o Maracanãzinho, ou via chamada telefônica normal.

Ao lembrar a Boni que a responsabilidade pela programação artística do FIC era minha, e não dele, alterou-se. A conversa esquentou e ao final, aos berros e aos palavrões desligamos os telefones.

Porém acabou tudo num acordo. O número que não aconteceu no estádio acabou sendo apresentado no Teatro Municipal, na cerimônia de entrega dos prêmios.

Houve alguns outros perrengues menores e maiores.

O maior deles está contado no livro A Era dos Festivais, de Zuza Homem de Mello.

Depois de minha saída da Globo, houve mais um inesquecível encontro com Boni.

Na boate Number One, em Ipanema.

Não sei por que cargas d’água e também não lembro a que show assistia naquela noite, me vi comentando com um estranho sentado à mesa ao lado, a qualidade de determinado vinho.

Um vinho branco alemão da região do Reno.

O desconhecido havia criticado a bebida, não concordei, ao que passou a dar-me uma aula sobre vinhos. Como estou sempre disposto a aprender e tinha modesto conhecimento sobre o assunto, prontamente calei-me e me pus a escutar.

Repentinamente uma voz firme soou vinda da mesa de trás.

Na escuridão da boate, que naquele momento tinha todos os holofotes dirigidos para o palco, custei a identificar o autor da frase retumbante:

— Está errado!

Era Boni.

Na sequência alertou-me que estava sendo enganado. Que as opiniões do enologista da mesa ao lado eram totalmente cascatas. Que o vinho em questão, da margem direita do Reno não era nada daquilo que tentava me convencer, etc. etc. etc.

Fiquei boquiaberto com a explanação.

E com a gentileza de ter me acudido.

Mas não foi por isso que desculpei a intromissão sem consulta na minha área do Festival Internacional da Canção.

Naquela matéria, o especialista, modéstia às favas era eu. Não havia, porém, como tirar-lhe parte da razão, visto que a apresentação fazia parte de uma transmissão de TV, tema que domina como ninguém.

Por isso mesmo, no final houve um acordo.

No entanto, ter feito as pazes ao som de boa música, minha especialidade, e vinho, outro assunto que conhece profundamente, afastou a lembrança da situação ruim de outrora e hoje faz parte dos momentos surpreendentemente bons da vida.

Good times, bad times. Gimme some of that.

 

Música do dia

  • Guttemberg Nery Guarabyra Filho, ou Guttemberg Guarabyra, ou apenas Guarabyra, nascido em Barra, Vale do São Franscico, Interior da Bahia, cronista de ABCD REAL, músico, compositor, escritor e poeta brasileiro. Entre seus maiores sucessos como compositor estão as canções “Mestre Jonas” e “Outra vez na estrada” (ambas em parceria com Luiz Carlos Sá e Zé Rodrix), “Casaco Marrom” (com Renato Correa e Danilo Caymmi), “Sobradinho” (com Luiz Carlos Sá) , “Espanhola” (com Flávio Venturini), Dona e muito mais. Escreveu O Outro Lado do Mundo e Teatro dos Esquecidos, além de inúmeras crônicas.

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