Sorrir pitangas

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  • Guttemberg Guarabyra

‘Bom dia, dona amoreira’. ‘Bom dia, mas não espalhe que estou aqui. Preciso de paz para crescer’.

Chorar pitangas.

Pitanga quer dizer vermelho, em tupi-guarani. Os portugueses, para melhor entendimento nas primeiras conversas com nossos índios, inventaram essa expressão para usar em lugar de ‘chorar lágrimas de sangue’, que haviam trazido do ultramar.

Em São Paulo as pitangueiras florescem literalmente em qualquer lugar. Bons conhecedores da flora já apontaram mudinhas crescendo até nas fendas de calçadas quebradas da cidade grande.

Se todas conseguissem permanecer se desenvolvendo até virar as árvores, que chegam a ultrapassar dez metros, as ruas paulistanas, em que tanta gente chora pitangas, acabariam por sorrir uma inesperada mata atlântica rubra e perfumada atrapalhando o trânsito.

O que proporcionaria uma rara alegria para os pedestres enquanto, porém e inevitavelmente, ampliaria o incessante desespero dos motoristas.

Nessa contenda eu tomaria o partido dos pedestres.

Colheria pitangas à mancheia. Uso o termo raro e lembro da pequena Praça do Livro, em Bom Jesus da Lapa, em que a escultura do busto de Castro Alves era assentado sobre um livro aberto esculpido em cimento, que continha entalhado, no formato de letras manuscritas, o verso do poeta: ‘Livros, livros à mancheia’.

‘Pitangas, pitangas à mancheia’, colorindo a boca de crianças gulosas, impregnando a cozinha de vermelho, nas geleias, nos doces, nos sucos, na vida.

E daí vem a Univali anunciar que, apesar dos cada vez mais frequentes cortes orçamentários, continua insistindo, feito uma pitangueira teimosa, em florescer e dar frutos à nossa ciência. E que uma pesquisa produzida a partir da essência das sementes de nossa fruta corajosa, comprovou que o óleo é espetacularmente eficaz no combate do gravíssimo câncer do intestino.

Já faz tempo que ando pelas calçadas paulistanas prestando atenção nas mudas de plantas obstinadas que perseveram no seu direito de nascer.

Para quem não sabe, somam-se a essas intrépidas espécies a amoreira e uma certa variedade de fícus, que teimam em dar um alô aos cidadãos a partir das fendas das calçadas.

‘Bom dia, dona amoreira’. ‘Bom dia, mas não espalhe que estou aqui. Preciso de paz para crescer’.

Acho que a amoreira tem medo à toa. Não há quem não gostasse de vê-la progredir.

Porém o fícus tem mesmo que tomar cuidado. Quando consegue se esgueirar por baixo dos pisos, sabota encanamentos, entorta muros, e, embora não tenha a menor culpa de ser culpado, já é sério candidato a inimigo público.

Infelizmente no Brasil de hoje não só plantas e florestas, mas também a Educação vem sendo ameaçada de se ver desacreditada publicamente como coisa inimiga.

Pra nossa sorte, no entanto, a Univali, que já é árvore grande, não desiste de nos dar frutos.

Trabalha, vai em frente.

Destemidamente, prefere saber de sorrir e não de chorar pitangas.

 

Música de hoje.

  • Guttemberg Nery Guarabyra Filho, ou Guttemberg Guarabyra, ou apenas Guarabyra, nascido em Barra, Vale do São Franscico, Interior da Bahia, cronista de ABCD REAL, músico, compositor, escritor e poeta brasileiro. Entre seus maiores sucessos como compositor estão as canções “Mestre Jonas” e “Outra vez na estrada” (ambas em parceria com Luiz Carlos Sá e Zé Rodrix), “Casaco Marrom” (com Renato Correa e Danilo Caymmi), “Sobradinho” (com Luiz Carlos Sá) , “Espanhola” (com Flávio Venturini), Dona e muito mais. Escreveu O Outro Lado do Mundo e Teatro dos Esquecidos, além de inúmeras crônicas.

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